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Candidatos a vereador replicam histórias compradas na internet

Com uma história pessoal, o candidato a vereador se apresenta aos eleitores na internet: “Uma das coisas que aprendi no início da minha carreira e que carrego até hoje: a de nunca desistir por mais difícil que algo seja”, diz.

Rogério Ribeiro (PL), que concorre em Sete Lagoas (MG), conta que foi a sua mãe que o ensinou isso. Fátima do Sindicato (PL), que disputa em Guapimirim (RJ), menciona Meirelles, seu “líder e dirigente sindical”. Genivaldo Pacu (Avante), candidato a vereador em Carmésia (MG), diz que aprendeu com o “Albano”, seu primeiro chefe.

A história contada por todos é quase idêntica, apenas com o exemplo da frase alterado e, no caso de Fátima do Sindicato, com algumas adaptações.

As publicações continuam: “ele sempre dizia que se eu me dedicasse aquilo que ninguém gostava de fazer, aprenderia algo de valor. Claro que eu não gostava, e cheguei até a discutir com ele algumas vezes. Mas quando eu olho para trás, consigo ver o quanto isso me ajudou até hoje.”

A mensagem usada pelos candidatos figura como exemplo no site de marketing político digital da Conteúdo para Vereador. A empresa oferece textos prontos para publicação nas redes sociais e em grupos de WhatsApp.

Nos últimos dois meses e meio, o empresário Marcelo Vitorino, dono da empresa –e também da Eu Vereador, que oferece conteúdos online–, investiu cerca de R$ 100 mil no Facebook, conseguindo destaque no ranking de impulsionamento (postagens pagas) político da rede.

A empresa é de um recente mercado de agências que comercializa ebooks com táticas para engajar internautas, santinhos virtuais editáveis, mensagens prontas para publicação e até listas de slogans e frases motivacionais, que vão de Aristóteles a Steve Jobs.

“Acordou sem ideia do que publicar sobre sua campanha eleitoral hoje? Chega de sofrer pensando no que publicar em suas redes sociais”, diz um dos anúncios impulsionado por Vitorino, professor de cursos de extensão da ESPM, que colocou R$ 109.974 no Facebook no período.

A empresa promete resolver a falta tempo e a criatividade de candidatos: “Textos prontos para a sua campanha de vereador”, diz anúncio.

Em um mês, a plataforma ganhou mais de mil clientes. São candidatos e profissionais de comunicação espalhados pelo Brasil, segundo Vitorino.

Por R$ 89,90, eles recebem no WhatsApp de três a quatro sugestões diárias de textos a serem compartilhados.

Apesar de vender o que chama de mensagem pronta, o empresário diz que os conteúdos não são feitos para serem apenas copiados, mas para serem adaptados às histórias e propostas de cada um.

Na prática, porém, nem sempre isso acontece. No dia 9 de outubro, um texto sobre sustentabilidade ambiental foi compartilhado por vários candidatos a vereador.

“Tá calor, né? Sem vontade de sair de um lugar coberto? Sabe como a gente resolve isso aqui? Com a minha proposta do IPTU Verde vamos estimular os moradores a preservar áreas verdes através de descontos de impostos. Quanto mais árvores plantamos e cuidamos, mais verde, fresca e bonita nossa cidade fica!”, diz trecho da mensagem.

Praticamente o mesmo texto foi publicado por candidatos de várias cidades e diferentes partidos, entre eles, Caio Cruz (PTB), que concorre em Aguaí (SP), Reinaldo Madureira (PRTB), de Monte Alto (SP), Danilo de Moura (Democracia Cristã), que tenta a vereança em Brumadinho (MG), e a página do perfil PSL Itapetininga-SP no Facebook.

Até os emojis de árvores e uma carinha suando foram repetidos. Diferente, apenas as hashtags, o nome da cidade e, claro, o dos candidatos. Eles também incluem cards com foto diferentes para tentar personalizar a mensagem.

“Eu mesmo crio as mensagens. Tinha a opção de sair fabricando sugestões, mas preferi fazer todos os dias porque assim eu entendo a temperatura da campanha”, diz Vitorino. Ele afirma nunca ter visto candidatos copiarem e colarem as mensagens.

A empresa não é a única a vender conteúdo digital para campanhas. Trabalho semelhante faz a agência Nufoco, de Governador Valadares (MG), que também anuncia seu serviço em postagens pagas no Facebook.

A empresa investiu mais de R$ 70 mil em anúncios na plataforma para vender o Pack Campeão a 2.300 pessoas, de acordo com o fundador Lucas Patrick Gonçalves Oliveira.

Cada pacote custa R$ 147 e inclui mais de mil arquivos com imagens de santinhos virtuais, animação para Instagram, mensagens para redes sociais e 120 slogans. As campanhas só precisam de conhecimento básico de Photoshop para incluir rosto e nome do candidato no layout.

“O pack visa entregar um material visual para pessoas que ou são leigas ou que não têm tanta possibilidade de investir em criação, ou pessoas que querem ganhar dinheiro vendendo para vereadores e prefeitos”, diz Oliveira.

O combo campeão também reúne ebooks com estratégias para engajar eleitores, calendário de postagens e a inclusão em um grupo de Telegram com mais de 300 pessoas.

Até um plano de governo já foi compartilhado para que assessores pudessem usar como referência nas campanhas em que trabalham.

O advogado André Giacchetta, do escritório Pinheiro Neto, questiona o serviço. “Se o texto for inovador, criativo e que, portanto, pode ter proteção de direito autoral, no caso de um slogan de campanha muito bem montado, sua reprodução é questionável”, afirma.

Não é o caso específico de boa parte desses pacotes, em que as mensagens têm um tom genérico. Mesmo que não viole direitos autorais, a eficácia da prática depende, em parte, do tamanho do público a ser atingido.

Um candidato sem recursos de uma cidade pequena, por exemplo, pode aperfeiçoar sua campanha com santinhos prontos, mas redutos eleitorais maiores demandam mais da comunicação de seus vereadores, avalia Gabriel Rossi, especialista em marketing e professor da ESPM.

Segundo ele, a maturidade das campanhas digitais evoluiu pouco desde 2016, pois muitos ainda confundem marketing eleitoral com o corporativo, que tem regras diferentes na sua visão. “É preciso respeitar as figuras arquetípicas”, diz Rossi.

Ele se refere a conceitos básicos do marketing político relatados no livro “O Estado Espetáculo”, escrito pelo político francês Roger-Gérard Schwartzenberg em 1968.

A obra cita quatro arquétipos a serem considerados: pai, líder charme, herói e homem simples. No Brasil, Rossi diz que se enquadrariam nesses conceitos Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Collor e Lula, respectivamente.

“Se o seu candidato tem o arquétipo do pai, você não vai colocá-lo dançando lambada no TikTok, certo? Porque não representa essa figura.”

Procurado pela reportagem, o candidato Rogério Ribeiro disse que comprou um curso sobre estratégia eleitoral. E não quis responder sobre publicações idênticas em sua rede e na de outros políticos.

Já Danilo de Moura, de Brumadinho, afirmou que tinha uma pessoa o ajudando, mas que ela teve um problema de saúde e ele, sozinho e com poucos recursos, contratou a estratégia de Vitorino para auxiliá-lo. Ele mescla algumas frases do pacote com autorais.

“Alguns textos fiz, alguns peguei no Conteúdo para Vereador. A gente costuma alterar algumas palavras para não copiar”, diz.”‘Cuidar do idoso, além de respeitar nosso futuro é também uma forma de carinho ao próximo.’ Essa é minha, se você ver em algum lugar, copiaram.”

Já o candidato Caio Cruz disse que desconhecia outras publicações idênticas e afirmou que vai repensar sua estratégia. Reinaldo Madureira, Fátima do Sindicato e Genivaldo Pacu e os responsáveis pela página do PSL Itapetininga no Facebook não responderam à reportagem.

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