Existe um lugar onde os torcedores alviverdes podem se orgulhar de carregar o nome do time na certidão de nascimento. Eles não são tão numerosos quanto a coincidência do nome poderia sugerir, mas os palmeirenses da cidade baiana de Palmeiras festejaram com euforia o título da Libertadores. Houve carreata com direito a foguetório e buzinaço pelas estreitas ruas de paralelepípedo do município localizado na Chapada Diamantina, a 440 km de distância de Salvador.
“Em Palmeiras só existem dois tipos de torcedores: os palmeirenses e os antipalmeirenses. E quem é do contra tem mais é que chorar e aplaudir a nossa vitória”, ironizou Paulo Ricardo Caitano Rodrigues, o Cadin, um dos mais fanáticos torcedores alviverdes de Palmeiras. Ele reuniu um grupo de mais de 30 palmeirenses para assistir ao jogo no Bar Caimon, do amigo Ailson Silva, segundo ele, um dos últimos cinco santistas vivos da cidade.
“Hoje o Santos tem a maior torcida de Palmeiras. Quem não é palmeirense hoje é santista”, retruca Ailson, apontando para a legião de corintianos, flamenguistas, vascaínos, são-paulinos, atleticanos e gremistas, entre outros, que anunciavam a disposição de não apenas a apoiar o alvinegro praiano durante o jogo, como a celebrar com estardalhaço um eventual título do Santos. O corintiano Bruno Souza admite que estava pronto para comandar uma carreata para comemorar a vitória do Santos com seus amigos com o único propósito de “pirraçar” os palmeirenses. Ele não vê nenhuma contradição entre ser palmeirense no registro de nascimento e torcer para o Corinthians. “Se fosse assim todo paulistano teria que torcer para o São Paulo”, comparou.
De fato, a similaridade entre o Palmeiras paulista e a Palmeiras baiana se restringe ao nome. O clube foi fundado em 1914 sob alcunha de Palestra Itália, mas teve de assumir uma nova identidade em 1942 para evitar represálias a entidades com imagem associada a países adversários do Brasil na Segunda Guerra Mundial. Reza a lenda que o nome substituto teria sido escolhido por preservar parte do original na grafia e, ao mesmo tempo, representar um símbolo da brasilidade, imortalizado num dos mais conhecidos versos da poesia Canção do Exílio, de autoria de Gonçalves Dias: “Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá”.
Palmeiras, a cidade, foi oficialmente fundada em 1891, embora o nome já fosse utilizado antes mesmo da emancipação, no início do século XIX. As primeiras paixões clubísticas despertadas na cidade foram dos times do Rio, a partir da década de 1970, quando só havia transmissão de TV aberta pela Globo fluminense. Somente a partir de meados dos anos 1990, com o advento da chamada ‘Era Parmalat’, que os nativos de Palmeiras começaram a se identificar com o clube Palmeiras, muitos deles por influência do período em que viveram na capital paulista.
Não é o caso do servidor público Eurico Miranda, 67, que apesar de ser homônimo de um ex-dirigente vascaíno, ostenta a paixão pelo Palmeiras desde o período em que passou um período de sua infância em São Paulo, e viu na paixão pelo clube de Parque Antártica uma forma de manter o vínculo com a sua terra natal. Eu escolhi o Palmeiras por causa do nome, mas também por causa do time. Acompanhei a segunda Academia, com Ademir Da Guia, Leão, Luís Pereira e Leivinha ganhando, sendo bicampeã brasileira em 1973″.
Miranda fez do “palmeirismo” sua profissão de fé e converteu a filha Erica, os netos Teo e Davi, e até mesmo o genro, Saulo. Horas antes da partida, organizou uma expedição com a família e os amigos Marcos Andrade e Paulo Ricardo para uma sessão de fotos no ponto mais alto de Palmeiras: o Morro do Pai Inácio, montanha de 250 metros de altura e 1.120 m.
O atrativo, um dos mais visitados de toda a Chapada Diamantina, é um dos orgulhos de Palmeiras e, ao mesmo tempo, o ponto de discordância que alimenta a rivalidade com a vizinha Lençóis. Oficialmente está situado do lado palmeirense da divisa entre as duas cidades, informação muitas vezes omitida aos visitantes baseados em Lençóis, que abriga a maioria dos turistas da região.
“O Pai Inácio está para Palmeiras assim como a América está para o Palmeiras”, brincou o aracajuano Gildenar Andrade Júnior, que juntamente com seus conterrâneos Denilson Silva e Adriano Nascimento juntou-se à família Miranda para fincar a bandeira do Verdão no cume da montanha de onde se avista uma imensidão verde que recobre a vegetação do Parque Nacional da Chapada Diamantina.
Pelo menos hoje, assim como Santos, Palmeiras, o clube, também tem um lugar no mapa para chamar de seu. E os palmeirenses dos mais longínquos rincões do país, incluindo os de nascença, já fazem planos para conquistar o mundo.
Chapada News com informações de Aurelio Nunes, colaboração para o UOL, em Palmeiras (BA)
31/01/2021 10h34.