Concessionária de energia de SP já tem mais de R$321 milhões em multas aplicadas na Aneel desde 2018, mas apenas três das sete multas haviam sido pagas até o fim do mês de março.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, anunciou nesta segunda-feira (1°) que determinou à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a abertura de um processo disciplinar para investigar o que ele chama de “transgressões reiteradas” da concessionária Enel em São Paulo.
Em entrevista à GloboNews, Silveira disse que a concessionária já é alvo de mais de R$ 300 milhões em multas aplicadas pela Aneel, órgão responsável pela fiscalização dos serviços prestados pelas concessionárias de energia em todo o país.
“Queria comunicar a todos os paulistanos que hoje estou tomando uma medida muito severa, rigorosa. Estou determinando à Aneel a abertura de um processo disciplinar que venha a apurar as transgressões reiteradas da Enel com a população de São Paulo, que podem levar inclusive a um processo de caducidade [da concessão]”, disse o ministro.
“Foram mais de R$ 300 milhões de multas aplicadas à Enel, nenhuma delas paga. A Enel tem reiteradamente prestado serviço de qualidade muito aquém do que determina inclusive a regulação”, completou. Na carta enviada à Aneel,o ministro citou até a possibilidade de cancelamento do contrato da Enel SP por falhas na prestação do serviço de distribuição de energia.
O g1 procurou a empresa para comentar as declarações do ministro, mas não recebeu retorno até a última atualização desta reportagem.
Trecho da carta enviada pelo ministro Alexandre Silveira à Aneel sobre a situação da Enel-SP — Foto: Reproduçõa/MME
Em meados de março, o ministro já tinha dito que havia encaminhado um ofício à Aneel determinando “célere e rígida apuração dos fatos, bem como responsabilização e punição rigorosa da concessionária” contra a empresa Enel, que tem de apresentado problemas constantes na qualidade da prestação dos serviços.
“A interrupção nesta segunda-feira se soma a diversas outras falhas na prestação dos serviços de energia elétrica pela concessionária Enel SP, que tem demonstrado incapacidade de prestação dos serviços de qualidade à população”, disse o ministro naquela data.
Multas não pagas pela empresa
Conforme o g1 publicou semana passada, apesar das fiscalizações, a Enel não tem pago as multas aplicadas pela Aneel e tem usado todos os recursos jurídicos dentro da agência para protelar os pagamentos.
Multada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em R$ 165,8 milhões após o apagão que deixou boa parte da cidade de São Paulo no escuro no ano passado por uma semana, a Enel ainda não quitou a dívida com a agência.
A multa foi aplicada no início de fevereiro deste ano e tinha dez dias para ser paga ou contestada pela companhia, segundo a Aneel.
Passado mais de um mês do fim do prazo, a concessionária de energia ainda não liquidou a dívida e, de acordo com a agência, há um recurso administrativo interposto pela concessionária em fase de análise.
Isso significa que a empresa discute a forma de pagamento da punição com o órgão regulador.
R$ 321,5 milhões em multas aplicadas
Segundo a agência, desde 2018 a Enel foi autuada nove vezes pela agência por problemas operacionais ou na prestação de serviços em São Paulo. Em pelo menos sete processos, a empresa foi multada.
No total, a Aneel já aplicou R$ 321 milhões em multas na concessionária paulista. Apenas três delas haviam sido pagas até o final de março.
Desde 2019, a empresa recorre na agência por multas aplicadas e não efetuou nenhum outro pagamento desde 2021. Apesar disso, o lucro líquido da empresa em 2023 foi de R$ 1,3 bilhão no ano (veja mais abaixo).
Autuações da Aneel contra a Enel SP
ANO | Natureza da Fiscalização | Penalidade (R$) | Situação |
2018 | Qualidade de Atendimento ao Consumidor | 16.214.457,76 | Multa Paga |
2019 | Verificação de Cumprimento de Determinação | 1.855.773,10 | Multa Paga |
2019 | Comercial | 12.089.287,84 | Em tramites para cobrança. |
2020 | Técnica | 13.512.333,39 | Em Recurso Administrativo |
2021 | Técnica | 16.245.909,83 | Multa Paga |
2022 | Comercial | Advertência | – |
2022 | Técnica | 95.872.180,95 | Em tramites para cobrança. |
2023 | Verificação de Cumprimento de Determinação | Advertência | – |
2024 | Avaliação do atendimento a ocorrências emergenciais e da atuação da distribuidora frente ao evento climático ocorrido no dia 03/11/2023 | 165.807.883,49 | Em Recurso Administrativo |
Total de multas aplicadas | 321.597.826,36 |
Por meio de nota, a Enel Distribuição São Paulo disse que tem “intensificando os investimentos para elevar a qualidade do serviço e enfrentar os desafios por que passa o setor elétrico com avanço das mudanças climáticas”.
“Desde 2018, quando a Enel adquiriu o controle da Eletropaulo, a companhia investiu R$ 8,34 bilhões na área de concessão em São Paulo, que inclui a capital e 23 municípios. A companhia tem realizado uma média anual de investimentos da ordem de R$ 1,35 bilhão por ano, contra cerca de R$ 800 milhões por ano investidos pelo controlador anterior. Em 2022 e 2023, foram aportados cerca de R$ 1,96 bilhão e R$ 1,64 bilhões, respectivamente, um recorde histórico de investimentos”, disse.
Lucro líquido de R$ 1,3 bilhão
Além de São Paulo, a concessionária, com sede em Roma, tem operações no Brasil também nos estados do Rio de Janeiro e do Ceará. Ao todo, a Enel atende 36 milhões de pessoas no Brasil (20 milhões são moradores de cidades paulistas).
A multa de R$ 165 milhões representa apenas 0,85% dos R$ 19,2 bilhões faturados pela empresa durante todo o ano passado apenas no estado de São Paulo ou 12% do lucro líquido da companhia no período, que foi de R$ 1,3 bilhão.
Segundo o relatório anual de administração da companhia, a receita líquida da Enel em 2023 cresceu 2,5% em relação ao ano anterior (2022), quando o faturamento total foi de R$ 18,7 bilhões em São Paulo.
Mapa da operação da Enel no Brasil — Foto: Reprodução/GloboNews
No período, a companhia elétrica paulista teve lucro líquido de R$ 1,3 bilhão, queda de 7,7% em relação aos R$ 1,4 bilhão de 2022. Porém, o chamado Ebitda da empresa (lucro antes dos descontos com impostos, juros, amortização e depreciação) – usado para avaliar a saúde financeira das empresas na bolsa de valores – foi de R$ 4,38 bilhões.
O valor significa alta de 4,7% (R$ 197,1 milhões) em relação ao mesmo período em 2022, quando o Ebitda da Enel somou o valor de R$ 4,18 bilhões. “O aumento do Ebitda é explicado principalmente pelo aumento da receita operacional líquida, resultado do menor nível de deduções no período”, disse o relatório publicado pela companhia.
Total de multas contra a Enel na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) — Foto: Reprodução/GloboNews
Diferentemente do lucro líquido, o indicador Ebitda mostra o resultado operacional da empresa juntamente com a depreciação e amortização. Significa a geração de caixa com as operações gerais da empresa. É a cifra usada para entender o funcionamento anual e ajuda na tomada de decisões dos executivos na hora de fazer novos investimento.
Dito isso, a multa de R$ 165 milhões aplicada pela Aneel representa menos do que os R$ 197,1 milhões que a empresa teve de acrécimo no Ebitda durante o período de 2023.
O que diz a Enel
Com tantos números positivos, a empresa afirma que estratégia no período de 2024-2026 é investir quase US$ 3 bilhões em distribuição de energia nas três áreas de concessão onde atua (RJ, SP e Ceará), “principalmente para aumentar a qualidade e a resiliência da rede elétrica e melhorar o serviço prestado aos clientes”. “Muitas iniciativas já estão em curso, como a modernização da estrutura da rede, a digitalização do sistema, o aperfeiçoamento dos canais de comunicação com os clientes, além da elevação dos graus de criticidade nos planos de contingência e a mobilização de mais equipes em campo”, declarou a companhia.
O objetivo dos investimentos, segundo a empresa, é melhorar os indicadores operacionais DEC – que medem o tempo médio que cada unidade consumidora ficou sem energia elétrica – e FEC (que contabiliza o número de interrupções ocorridas) nas áreas onde atua. “[Esse indicadores já] estão melhores do que os valores estabelecidos pela Agência Federal (Aneel) para a área de concessão de São Paulo. E a Enel está focada em reduzi-los ainda mais: desde 2017 (ano anterior à chegada de ENEL em SP) esses indicadores já melhoraram quase 50%”, declarou.
Nova investigação na Aneel
Na terça-feira (19), o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, encaminhou um ofício à Aneel determinando “célere e rígida apuração dos fatos, bem como responsabilização e punição rigorosa da concessionária”, que tem de apresentado problemas constantes na qualidade da prestação dos serviços.
A notícia foi divulgada após moradores do Centro de São Paulo ficarem sem luz desde segunda-feira (18).
“A interrupção nesta segunda-feira se soma a diversas outras falhas na prestação dos serviços de energia elétrica pela concessionária ENEL SP, que tem demonstrado incapacidade de prestação dos serviços de qualidade à população”, disse a nota do ministério.
A nova investigação pode gerar novas multas para a empresa paulista. A concessionária também foi notificada pelo Procon-SP para que envie informações detalhadas sobre as interrupções no fornecimento de energia elétrica em diversos pontos da Capital paulista, desde a última sexta-feira (15), quando o aeroporto de Congonhas também precisou interromper suas operações.
As explicações devem ser enviadas em até 7 dias e serão analisadas pelos especialistas do Procon-SP.
O que diz a Enel sobre o novo apagão
Por meio de nota nesta sexta-feira (22) que “lamenta os transtornos causados aos clientes que nos últimos dias foram impactados por ocorrências envolvendo a rede de distribuição subterrânea da companhia na região Central da cidade”.
“A distribuidora esclarece que os problemas iniciaram a partir de danos provocados em distintos circuitos subterrâneos, cuja reparação é complexa e demorada, dada as dificuldades e especificidades desse tipo de rede (galerias subterrâneas). As redes que foram impactadas localizam-se nas regiões de Higienópolis, Santa Cecília e 25 de Março”.
“A Enel reitera que tem empenhado todos os esforços e recursos para restaurar os parâmetros originais e a configuração das redes afetadas. A companhia também tem disponibilizado geradores de médio e grande porte para abastecer os clientes impactados, enquanto segue trabalhando nos reparos até a plena normalização do serviço”, completou a empresa.
Fonte: G1